A Tsunami de ‘50 Tons’ invade a Biblioteca Pública de Nova Iorque
Por Ninah Alves
Há pouco mais de um ano o mundo
sofreu consideravelmente com a tsunami que se deu com a trilogia de 50 Tons de
Cinza. Avalanches de calcinhas molhadas foram expostas em praça pública por
mulheres antes consideradas pacatas cidadãs e demasiadamente santas. O portal bondage,
- antes guardado a sete chaves por seus seguidores -, foi revelado mundialmente
para desespero daqueles que a todo custo tentavam encobrir a existência desse
lado negro do sexo. Para aqueles que nunca tinham ouvido falar, um novo mundo
de prazer era revelado e marcado com chicotes, correntes, vendas e verdadeiras demonstrações
de submissão.
Aproveitando a onda, algumas
autoras amplamente pervertidas, agarraram
suas pranchas de surf e consideraram
publicar suas obras revelando assim a quem fosse mais atrevido que elas, o que
o submundo do BDSM era capaz.
No dito romance A Bibliotecária (Record: Tradução de Ryta Vinagre; 283
páginas; R$ 29,90; 2013), escrito pela publicitária e agente literária Logan
Belle (pseudônimo de Jamie Brenner) que já foi traduzido para doze idiomas, a
escritora nos conta um pouco a vida de Regina Finch que acaba de chegar a
Manhattan para trabalhar na Biblioteca Pública de Nova Iorque.
Nas primeiras linhas, ela se
preocupa em mostrar a insegurança de Regina em não conseguir passar na
entrevista para o emprego dos seus sonhos, na forma elegante e despretensiosa
que as nova-iorquinas se vestem em comparação a ela uma cidadã comum da
Pensilvânia e em como uma recém mestranda em biblioteconomia e ciência da
informação pela Universidade de Drexel acaba indo parar atrás de uma mesa de retirada.
De então, vemos um obstáculo para a protagonista, que ao mesmo tempo se sente humilhada
por sua chefe ao não ter considerado nada do seu currículo e intimada a provar
que o diploma que carrega é muito mais que um papel timbrado em letras
ornamentais.
A narrativa instigante do
primeiro capítulo me levou rapidamente ao segundo, e lá encontrei uma Regina
que além de insegura também sofria de problemas sexuais. Em nenhum momento a
autora cita a idade da sua personagem, o que me leva a crer que com seu histórico
escolar, universitário e o mestrado, ela tenha entre 27 e 28 anos. Fica claro que
desde cedo, Regina sofre bullying por
parte de sua mãe, que vê os homens como distração e ladrões de sonhos. Com
isso, ela se reversa, estuda, se toca na calada da noite e os poucos namoros
que consegue ter são tão decepcionantes que não são dignos de uma boa noite de
amor. Também confesso que ao ler o segundo capítulo e notar que Regina divide o
apartamento com uma estudante universitária, que tem uma vida social ativa e
regada de aventuras sexuais e que a cada dia leva um homem diferente para o
apartamento estranhei como essa relação um dia poderia se tornar uniforme.
Naquele momento me vi pensando
que somente a falta de dinheiro levaria uma personagem tão intelectualmente
criada pela autora, - apesar das suas insegurança e tormentos psicológicos -, interagir
com outra que não passa de uma patricinha, mimada, filhinha de papai e fútil.
Em contrapartida, Regina além de
sofrer com o mal humor constante da sua chefe Sloan Caldwell, acaba por fazer
duas importantes amizades no trabalho: Alex (estudante da NYU, bonitinho e
estranho) e Margaret (uma bondosa e inteligente senhora que é curadora da
biblioteca).
Um dia, após recusar-se almoçar com
Alex, Regina decide passar na sala da curadoria a fim de convidar Margaret para
o almoço, só que ela acaba declinando do convite por motivos pessoais. Com
isso, Regina resolve em sua monotonia passear pela biblioteca enquanto volta
para os jardins a procura de Alex para almoçar e se depara com uma sala
reservada e lá dentro depara-se com uma cena arrebatadora e chocante: um homem
alto, cabelo escuro e desgrenhado, olhos negros, feições e corpo esculturais penetrava
com voracidade uma mulher que estava encurvada sobre um banco de mármore.
Posso dizer que aqui é o ponto
focal do livro, onde este se revela erótico, e nada mais do que isso.
Em todo tempo que perdi lendo 283
páginas, notei que a autora detinha uma grande estória nas mãos e a jogou fora,
tornando o livro maçante e com cenas desgastantes que vai da ida de Regina a
uma boate de burlesco com Carly (colega que divide o apartamento), a cenas
eróticas e de submissões forçadas. Até o convite para um jantar de negócios
entre ela e Sebastian Barnes me pareceu forçado e rápido demais.
As mulheres que já leram esse
livro e que gostaram de 50 Tons, deve ter sentido diferença só nas cenas que
não são tão promíscuas e baixas e até devem achar que Sebastian Barnes, é o
mais novo discípulo de Christian Grey, mas digo que assim com Christian,
Sebastian tem tanto dinheiro quanto e é tão louco/psicótico/possessivo quanto.
Não consigo compreender o que se
passa no momento criativo de uma autora que produz uma personagem bonita, cheia
de requisitos e com a plena capacidade de conhecer O príncipe encantado (por
mais que este não exista!), mas em contrapartida, a põe com bloqueio sexual,
virgem e que se depara com um homem tão bonito e arrebatador na sua forma
humana que só em respirar perto dela, já sente as pernas bambear.
Nesse momento eu deveria largar o
livro e parar de ser idiota ao ponto de acreditar que existiria algum romance,
pois em uma trama onde a personagem é seduzida, compelida a jantar com o
investidor mais importante da instituição, obrigada a ouvir que suas roupas não
são adequadas para ocasião e que uma pessoa a esperaria em um quarto de hotel,
a fim de ajeitá-la e no fim da noite ler uma conversa como esta:
“- Posso lhe dizer uma coisa?
– indagou ele. Algo em sua voz e no modo como seu olhar passou dos olhos aos
lábios de Regina deixou-a com o corpo tenso.
- Sim – sussurrou.
- Eu penso em trepar com você na
biblioteca.
O sangue tomou seu rosto. Ela baixou seu rosto para a mesa. E então,
entre as pernas, sentiu uma pulsação apavorante de desejo. “
Pág. 70 e 71
O livro além de ser totalmente
sem cultura, é podre na linguagem. E é claro que veio o desejo de Regina, o
livro é erótico, e com o isso, ela foi levada para casa por Sebastian e não
parou de pensar nele um só segundo e assim que se viu sozinha em seu quarto
iniciou a tarefa de se tocar igual uma louca desvairada.
O efeito Sebastian atingiu em
cheio a Regina. A autora conseguiu mais uma vez mostrar a incapacidade da
personagem de controlar seus atos e escolhas como ser humano, mas o efeito que ela
quis passar para as leitoras não me atingiu nem um pouco. Sinceramente, nem me
arrepiou. Fez tudo parecer normal, sensual e até criou um momento propício para
o jantar... Sebastian: O sedutor, O inteligente, O graduado
em literatura, que entende de moda, de vinhos, de mulheres,
de prazer sexual, mas que tem uma linguagem chula que dá ânsia de vômito.
Desse acontecimento em diante,
Sebastian começa a investir em Regina e contrata uma moto-girl para lhe entregar um convite para uma exposição de fotos,
uma sacola de compras com lingerie e um par de Louboutins, nestes dois últimos presentes ele é bem incisivo ao
escrever no recado que deseja que ela vista as peças imediatamente, o que ela
recusa, provocando a ida dele até sua casa para convidá-la a tomar um vinho.
Toda essa insistência traduz
claramente que o homem tem sério problema em aceitar que uma mulher o acha tão
atraente que ele chega a dá medo, então ela se recusa a sair com ele. Regina
se recusa a vestir a roupa de baixo para Sebastian e desfilar pra ele em sua
sala com o par de Louboutins (por
mais que queira!), ela se recusa a
ler o livro da Bettie Page que ganha de presente dele na primeira vez que se
encontram, nesses poucos momentos, achei que a personalidade de Regina estava
moldada, que apesar das suas inseguranças e temores ela era um mulher de
decisão. Mas me enganei!
Ela se torna submissa, se entrega
a Sebastian que no primeiro contato que tem com ela, a enche de tapas nas
nádegas, como se fosse uma criança que apanha para ser educada. Mas é isso que
ele faz, em todo o livro. Ele a educada! A insere no mundo do bondage, a trata
como objeto sexual. Regina então perde sua individualidade para se tornar
escrava de Sebastian que controla seus horários, vigia seus passos e a castiga
de diversas maneiras.
O mais engraçado disso tudo é que
ela gosta! Ele inflige medo e prazer a ela. A presenteia com uma colar de
cadeado de ouro com diamantes para que todos saibam que ela é sua propriedade.
E em meio a esse jogo de sedução, onde só ele sai ganhando, cada dia que Regina
é impelida a testar novas técnicas mais ela se pergunta porque ainda continua
com Sebastian.
O famoso complexo do patinho feio
vem à tona em caráter sexual e na forma mais fétida e submissa que se possa
imaginar. A priori a relação é
totalmente unilateral. Sebastian paga para os afazes de Regina e é bem
traduzido que tê-la se tornou um desafio, ainda mais quando descobre que era
virgem. Sem falar que o fascínio de Sebastian por Regina vai além, posso dizer
aqui, que ele, como fotógrafo, vê nela a personificação da Bettie Page, a pin-up mais famosa de todos os tempos
que largou a profissão de secretária para se tornar modelo erótica em fotos
P/B. Fotografá-la agora é sua meta, contudo isso é a única coisa que Regina
ainda é capaz de negar a ele.
Existe até um momento, uma
pequena faísca de esperança, em que Regina grita: “Basta! Já chega!” Na
verdade, não foi bem com essas palavras, mas eu gostei da hora que ela decide recuperar
o pouco da decência que ainda tinha e dá um basta na relação com Sebastian ao
descobrir que ele sabia tudo sobre sua vida, e ela, pouco sabia sobre dele.
Com isso começa o drama mexicano,
- se fosse mexicano seria bem melhor! -, em que ela chora nos braços da colega
de apartamento, se pergunta porque entrou nessa, admite pra si que o sexo era
bom, que sente uma necessidade intensa do Sebastian e que ele deveria ter
contado a ela que já ‘trepou’ com Sloan (sua chefe) e que
teve com ela um caso de submissão bondage.
Depois desse emaranhado todo de
cenas de sexo, a autora resolve explorar o lado problemático de Sebastian. Que
além de se achar o bambambã no BDSM,
também é egoísta, tem problemas com o pai, acha que causou morte da mãe e usa
da dominação como uma muralha, a fim de se proteger de todos os males que o
amor pode causar.
E foi tão ridículo a forma como
ela tratou o romance deles que a vontade que tive foi de rir. Faltando
cinquenta páginas para o fim do livro, ela transformou Sebastian em um homem
mais aberto ao diálogo, sem medo de demostrar que estava apaixonado e pronto
para qualquer desafio, até livrar Regina do colar de submissão e convidá-la
para morar com ele.
Embora Regina deixe bem claro que
a sua vida é biblioteca, sinto informá-los que a autora perde o foco quanto ao
trabalho da protagonista quando a entrelaça em todo erotismo com Sebastian.
Outro foco também perdido foi sobre o passado de Regina, que até é citado no
começo e meio do livro, mas depois desaparece como se nunca tivesse existido.
Livro lido, arquivado na estante
e com nota dois (2.0) – isso levando em conta a média do Skoob que vai de 1 a 5
-, pois ele pode não ter me acrescentado nada em termos culturais, mas valeu a
ousadia da autora em inventar uma estória erótica em meio a uma biblioteca
pública.
Conclusão: Não
indico o livro, a menos que você tenha gostado da leitura de 50 Tons de Cinza
Resenha feita em 17/11/13. A
prática do plágio é crime previsto no Código Penal em seu artigo 184.
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